Yoga e vegetarianismo
Qual a relação entre yoga e vegetarianismo?
Esse texto abordará apenas as citações diretas ao vegetarianismo presentes na filosofia da yoga. Em um texto futuro será abordado este tema de maneira mais ampla. Aqui estarei focada nos Yogasutras de Patanjali e no Hatha Yoga Pradipika, dois clássicos norteadores de toda a filosofia.
O alimento, a substância de apoio e consumidora de toda a vida, é considerado como uma fase de Brahman. Os homens são as únicas criaturas que comem quando não estão com fome e geralmente vivem para comer ao invés de comerem para viver.
Apesar dos Yogasutras de Patanjali não versarem diretamente sobre a conduta alimentar do praticante de yoga, a dieta vegetariana é como a jóia de uma coroa pois incorpora as bases de ahimsa, asteya, aparigraha, shaucha, santosha e tapas e produz pureza e clareza da mente e do coração. Ahimsa deve implicar que o alimento não deve ser obtido através da violência e morte, portanto quem consome carne, aves, peixes e ovos estão desrespeitando esse yama. Apenas a observância desse yama, que é o primeiro, já justifica a prática do vegetarianismo pelos praticantes de yoga.
Mas vamos dar sequência.
Asteya recomenda que o alimento ingerido não tenha sido roubado e tenha sido obtido de fontes adequadas, você já parou para pensar sobre os abatedouros e a pecuária? Ao observar Aparigraha, não se deve estocar ou armazenar comida além das necessidades imediatas de quem as consome. Você já deu uma olhada no seu freezer? Além disso, o praticante não deve ser exigente, sendo grato pelo alimento que lhe é disponível, isso é Santosha. O caráter é moldado pelo tipo de alimento que ingerimos e pela forma como o comemos. Demonstrar gratidão é uma forma de respeitar todas as pessoas que não tem comida na mesa. A comida que ingerimos determina a vibração do nosso corpo e da nossa mente, portanto deve-se evitar alimentos ou bebidas que alterem o estado de energia (Brahmacharya), como por exemplo o consumo de álcool, tabaco, ópio, maconha, outros intoxicantes e também a carne. A comida deve ser fresca e limpa. Durante o processo de cozimento o ambiente, utensílios e a água devem estar limpos, isso é Saucha. E Tapas com relação ao autocontrole, não comendo em excesso, observando Mitahara.
De acordo com o Hatha Yoga Pradipka, o 9º yama é Mitahara, que significa comer com moderação. Este é um requisito para a manutenção de uma boa saúde e essencial para o sucesso na yoga. De acordo com o dicionário hindu, a porção ideal por refeição é chamada kudava e representa em torno de 160g. Ainda de acordo com a definição de mitahara trazida pelo dicionário hindu, todos os seis sabores devem fazer parte da alimentação (doce, salgado, azedo, picante, amargo e adstringente), os alimentos devem ser preferencialmente cozidos e não deve-se consumir carne, peixe, aves ou ovos.
Comer uma dieta puramente vegetariana composta de grãos, vegetais e frutas, omitindo toda a carne, peixe e ovos, torna a mente mais leve e intuitiva. Uma dieta vegetariana facilita muito a prática da meditação, criando estados muito sutis de consciência prontamente atingível e perceptível.
Na minha opinião são inúmeras as razões para que, não apenas os praticantes de yoga mas também qualquer pessoa, adotem a dieta vegetariana. Aqui foram citados aspectos diretamente relacionados com a alimentação pelos dois textos mais clássicos e antigos da yoga. Quando se abrange, entrando em conceitos éticos e ambientais, as razões para deixar de comer carne crescem exponencialmente.
Mas seguindo com a ideia do texto, ao praticar yoga gradativamente nos reconectamos com o nosso corpo, aquietamos a nossa mente e passamos a nos perceber de maneira integrada: corpo, mente, espírito. Neste sentido, a percepção daquilo que nos cerca muda, compreendemos melhor aquilo que nos faz bem e aquilo que nos faz mal.
A primeira coisa que notamos diferença, talvez por ser mais fácil de sentir, é a nossa relação com o nosso corpo ao nos alimentarmos. Sentimos na pele quando comemos em excesso, é possível sentir o peso, a densidade. Quando comemos algo que não nos faz bem, sentimos o abdômen estufado, a fermentação, os gases, a mudança na consistência, coloração e cheiro das fezes. Conforme a nossa relação com nosso corpo vai se estreitando e a prática regular da yoga vai equilibrando toda a fisiologia do nosso corpo, do nosso relógio biológico, quando demoramos para evacuar se torna um problema. A percepção não apenas sobre aquele alimento parado ali no intestino mas também a sensibilidade em perceber as mudanças no nosso humor em decorrência daquilo. Os alimentos de origem animal, de uma forma geral, demoram mais para completar o trato digestivo e a sensação de peso, de gases, a sonolência, a queda da energia, a irritabilidade e a tendência a agressividade começam a serem notadas. Essa percepção vai fazendo com que a gente selecione melhor o alimento que ingerimos em cada refeição pois sentimos o que ele nos causa. Por causa disso os iogues acabam se tornando, naturalmente, vegetarianos. Mas, cada um com o seu tempo, respeitando seus desejos, seu corpo e a sua própria verdade. Segundo Iyengar, “Ser ou não vegetariano é uma questão puramente pessoal, cada pessoa é influenciada pela tradição e hábitos do país em que nasceu e foi criado. Mas, com o tempo, é recomendado ao praticante de yoga uma dieta vegetariana, a fim de atingir atenção direta e evolução espiritual”.
Que todos os seres possam praticar ahimsa,
Namastê
ॐ
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